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sábado, março 06, 2004

"Fala a Loucura - XXV

Desculpar-se-iam os filósofos que se mostram nos empregos públicos como o asno com a lira, se nos outros assuntos da vida se não mostrassem igualmente desajeitados. Convidai um sábio para jantar e ele estragar-vos-á o festim com o seu silêncio severo ou com dissertações aborrecidas. Convidai-o para dançar e dir-se-ia um camelo a saltar. Levai-o ao teatro e o seu rosto bastará para estragar o prazer do público, e obrigá-lo-ão a sair da sala, como aconteceu com Catão, por não ter conseguido deixar de mostrar um ar severo.
Se por acaso o filósofo toma parte numa conversa, é como se chegasse o lobo da fábula. Se se trata de comprar ou vender, ou de qualquer dos actos indispensáveis à vida quotidiana, o nosso filósofo não terá o ar de um homem, mas de um cepo. Não é prestável nem para si próprio, nem para a pátria, nem para os amigos, porque nada sabe das coisas vulgares e as opiniões e os hábitos correntes são-lhe completamente estranhos. Esta separação total dos outros espíritos atrai-lhe o ódio de todos. Poder-se-á fazer alguma coisa, de facto, no mundo, que não seja inspirada pela loucura, pelos loucos e para os loucos?
Aquele que se opõe ao sentimento geral apenas lhe resta o exemplo de Tímon, encerrando-se para sempre no deserto, para assim gozar sozinho a sua sabedoria."

Desidério Erasmo (1469-1436)











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